Os jogos são um problema de saúde pública
O gosto dos brasileiros por jogos de azar não é novidade. O jogo do bicho, por exemplo, foi criado no final do século 19 e até hoje atrai milhares de jogadores diariamente.
No entanto, nunca se gastou tanto em apostas como agora. Entre junho de 2023 e junho de 2024, os brasileiros gastaram cerca de R$ 68 bilhões em apostas online, segundo a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC).
As novas modalidades de jogos de azar, como as bets esportivas, preocupam especialistas em adição, pois elas podem ser acessadas de qualquer lugar e a qualquer hora, basta ter um dispositivo eletrônico. O problema não é exclusivo dos brasileiros. A revista científica The Lancet lançou um editorial alertando para o fato de que a adição em jogos constitui um problema de saúde pública.
De acordo com o periódico, os jogos são "uma ameaça à saúde pública negligenciada, pouco estudada e em expansão. O jogo não é uma simples atividade de lazer; é um comportamento viciante prejudicial à saúde. Os danos associados ao jogo são abrangentes, afetando não só a saúde e o bem-estar de um indivíduo, mas também seus bens materiais, relacionamentos, famílias e comunidades, com potenciais consequências para toda a vida e aprofundando as desigualdades sociais e de saúde."
Um estudo também publicado pela The Lancet alerta para o fato de que 1,4% dos adultos do mundo têm o chamado transtorno do jogo, reconhecido pelo Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-5).
Os pesquisadores concluíram que os jogos são um problema predominante no mundo todo, e que uma proporção substancial da população se envolve em jogos de azar. Para eles, os formatos online têm crescido exponencialmente, trazendo uma série de danos à saúde pública.
Elizabeth Carneiro, especialista em dependência clínica pela Unifesp e diretora da Clínica Espaço Clif, em entrevista concedida à repórter Beatriz Zolin, do Portal Drauzio, afirmou: "A máquina caça-níquel é uma das mais aditivas, porque o reforço é imediato. Você sabe se ganhou ou se perdeu imediatamente. A rapidez do reforço é o que determina o potencial de dependência. Agora, o que você tem é um caça-níquel ambulante, porque se não está rolando o jogo de futebol, está rolando o de vôlei. Então você pode jogar o dia todo".
De fato, basta uma rápida pesquisa na internet para nos depararmos com uma infinidade de jogos online envolvendo apostas e dinheiro. Também há inúmeros relatos de parentes de jogadores afirmando que seus familiares contraíram dívidas impagáveis em apostas online.
Segundo o Itaú BBA, a estimativa da receita anual das bets varia entre R$ 8 bilhões e R$ 20 bilhões. Estima-se que até um quarto do tráfego global de apostas esportivas venha do Brasil.
Para tentar mitigar o problema, em julho deste ano o Ministério da Fazenda publicou uma portaria que regulamenta os jogos de aposta. A partir de janeiro de 2025, as empresas sediadas no Brasil deverão ser certificadas, adotar uma série de medidas, como o bloqueio do pagamento com cartão de crédito, e assumir a responsabilidade legal por suas publicidades.
Além disso, elas precisarão impedir o cadastro ou limitar o acesso de pessoas que tenham o diagnóstico de transtorno do jogo, bem como alertar os usuários sobre o risco de dependência. Em caso de indícios de adição, percebidos pelos dados de navegação, o jogador será suspenso ou até banido.
Tratamento
O tratamento consiste basicamente em psicoterapia, embora em alguns casos possa ser necessário o uso de medicamentos.
O paciente deve passar por uma avaliação com um especialista em saúde mental para verificar se há outras condições psiquiátricas associadas, uma vez que dados indicam que na maioria dos casos de adição em jogos há outros transtornos psiquiátricos, como depressão, fobias, transtorno do pânico e dependência de algumas substâncias.
O grupo Jogadores Anônimos, irmandade cujos membros compartilham suas experiências, recebe gratuitamente pessoas com problemas em jogos em várias localidades do país.
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